Escolhas e consequências

Me lembrei hoje de uma conversa que meus tios tiveram comigo, quando saí da casa do meu pai e fui morar em Belo Horizonte. Basicamente eles me alertaram para o fato de que minha índole rebelde poderia me colocar em situações problemáticas. Me pediram que eu sempre pensasse bem no que ia fazer e que me inteirasse de possíveis consequências dos meus atos, não só na forma como afetaria outras pessoas, mas também em questões regulamentares ou legais: eu não ia ter um parente figurão para me tirar de uma situação ruim.

Essa conversa me alertou para essa realidade de que tem gente que consegue se safar de situações complicadas por ser parente de alguém influente, e de que eu não era esse tipo de gente. Entendi e levei a sério. Sempre me inteirei de leis e afins que regiam e regulavam o meu modo de vida, e procurei me cuidar. Quando me dei mal, assumi acatei a punição.

Nessa semana eu tenho visto esse pessoal que participou da depredação das sedes dos três poderes e acabou em cana, reclamando disso e daquilo. Sério?

É preciso prestar atenção em eventuais consequências do que a gente quer faazer e, a partir da disposição de enfrentar estaqs consegquências, escolher fazer ou não fazer. Na maioria dos casos é possível escolher, como foi nesse caso da confusão do dia 8.

Vejo esse povo repetindo a expressào “desobediência civil” nominando uma forma de protesto válido contra o que quer que seja que não lhes agrada. Até concordo, mas esse pessoal precisava ter lido o que Thoreau escreveu sobe “Desobediência Civil”: narrando sua saga de não aceitação dos impostos que lhe era cobrados, sua escolha de parar de pagar os impostos e da aceitação da pena que lhe foi imposta, a prisão, pois era o que determinava a regra vigente na sociedade em que ele vivia. Thoreau foi preso e ficou preso e aceitou a pena, pois era o que se previa para a ação que ele escolheu para protestar. Em outro momento, discordando da organização da sociedade onde ele vivia, decidiu abandoná-la, para poder viver pelas regras que ele mesmo determinasse. Abandonou tudo, se mandou para a beira do Lago Walden, construiu uma moradia com as próprias mãos e passou a viver com os recursos que a natureza lhe oferecia e que ele conseguisse capturar e colher com seu próprio esforço. Se era contra o Estado, escolheu viver sem as limitações que o Estado lhe impunha, mas sem usufruir das benesses que o Estado lhe oferecia. Como termiou? Leia o livro.

O fato é que os participantes da bagunça do dia 8 escolheram estar lá e, como vivem aqui nesta sociedade também por escolha, precisam se sujeitar às leis e regulamentos para usufruir das benesses oferecidas. É o que se costuma chamar de Contrato Social. Simples assim. Não adianta afrontar as regras, violentamente, diga-se de passagem, e depois reclamar que a salsicha servida na detenção está fria, ou que o banheiro não está limpo.

Mono e estéreo e os Beatles

Sou fã de Beatles e sempre fui, não me lembro da minha vida sem os Beatles.

Comecei a comprar meus discos em 1979, o SgT Pepper’s foi o primeiro. No meio dos anos 80, vendi todos pra comprar tudo de novo em CD (o Sgt Pepper’s foi o primeiro). Fiquei com estes CDs até 2010, quando comprei os remasterizados em 2009, os oito primeiros, em Mono (na verdade eu já tinha comprado um remaster do Álbum Branco em 1998, nos 30 anos do lançamento).

Mas o que justifica comprar discos mono no século XXI?

Os discos dos Beatles, do Please Please Me até Revolver, foram lançados originalmente em mono, e, posteriormente, relançados com um mix estéreo, e aí é que mora o pobrema.

Ali nos anos 60, as gravadoras ainda estava experimentando com o estéreo, e estava ainda vendo o que fazer com a separação dos canais esquerdo e direito.

Nestes discos, o mix é bem desse jeito: o instrumental no canal esquerdo, as vozes e solos de guitarra no canal direito. Não tem maiores problemas ouvindo nas caixas de som, mas coloque um fone de ouvido e… fica… esquisito.

Eis que em 2022 aconteceu Get Back, o documentário do Peter Jackson, mostrando as seções de Gravação do que viria a ser Let it Be, o disco e o filme. O documentário envolveu um processo complexo de recuperação e restauração de todo tipo de áudio, e o resultado foi de encher os olhos de lágrimas.

Aí alguém, não sei quem, se perguntou “e se a gente usasse esse arcabouço (adoro essa palavra) tecnológico nos discos mais antigos?”

Deu um caldo.

Pegaram o Revolver, separaram tudo, limparam, escovaram, deram um brilho, e fizeram um novo mix estéreo, sem as separações mirabolantes.

O disco vai ser lançado em Janeiro, se não me engano, mas agora em outubro já soltaram Taxman, com o novo Mix. Rapaaaaaaz…

Fiz essa playlist com três versões: mono (remaster 2009), estéreo (remaster 2009) e estéreo (remix 2022). Ouça e julgue.

Bardemia.

Tem um bar aqui perto de casa que dá pra ver da janela. As mesas ficam numa área aberta, dá pra ver tudo que acontece lá.

No carnaval, o governo liberou eventos nos bares, desde que respeitadas as regras sanitárias para a pandemia. O que se viu lá foi nenhuma regrta sendo respeitada: todo mundo sem máscara (dá pra ir no bar com máscara? Como é que come? Como é que bebe?), quase todo mundo de pé, circulando entre as mesas, muita gente aglomerada em torno das mesas, som ao vivo na área aberta (o que é proibido por lei mesmo fora da pandemia), pessoal cantando, dançando e gritando o tempo todo, gente aglomerada na calçada na frente do bar (também sem máscara). Num espaço chamado “brinquedoteca”, fechado e não ventilado, com apenas uma janela lacrada que dá para a rua, crianças permanecem confinadas enquanto os pais gozam da atividade de lazer oferecida pelo estabelecimento.

Houve denúncia para o GDF de que o bar não estava respeitando. a denúncia ocorreu no primeiro dia do carnaval. A ação de fiscalização só ocorreu na semana seguinte, e a resposta do GDF à denúncia foi a seguinte:

O estabelecimento foi orientado a

1) Providenciar organização geral e higienização da cozinha (utensílios);
2) Etiquetar os produtos acondicionados no freezer;
3) Armazenas os produtos em recipientes com tampas; e
4) Providenciar Lixeira com tampa e pedal.

Escapa à minha compreensão o que isso tem a ver com a denúncia.

De lá pra cá, o que se viu no carnaval se repete todo final de semana. já se vão 3 meses de desrespeito e o GDF é conivente com a situação.

No mundo civiizado se compreendeu que os bares são ambientes de alto risco:

Não se usa máscara, porque impede o propósito de se ir ao bar;

As pessoas falam aos berros, cantam bem alto;

As pessoas alcoolizadas não respeitam qualquer medida de distanciamento, talvez nem se lembrem que elas existem depois de um tempo.

No mundo civilizado, os governos providenciaram ajuda financeira para os proprietários de bares. No Reino Unido os bares permaneceram fechados por mais de 70 dias. Aqui os governos cedem à pressão constante das entidades representativas dos bares. Aqui, os trabalhadores dos bares seguem expostos ao ambiente de alto risco. Aqui os frequentadores se infectam e carregam a infecção para seu lares, para seus vizinhos, para o transporte coletivo, para os supermercados, para as farmácias, para todos os lugares que é impossível não frequentarmos. Tudo isso porque o lucro não pode parar. Tudo isso porque a única coisa que dá sentido à vida de algumas pessoas é a cerveja.

Medo, Indignação, tristeza. Isso Cansa.

Medo. Indignação. Tristeza. É isso. Por aí oscilam minhas emoções. nada além disso.
Fez um ano que estamos ficando em casa, saindo só para o indispensável.Há perspectiva de retornar ao normal? Há, mas indefinida.
Cansa. Cansa essa rotina de ficar ansioso quando descubro que vou precisar ir a algum lugar pra resolver alguma coisa. Cansa ficar imaginanndo se o lugar é fechado, se vai ter muita gente lá, se vou ficar lá muito tempo, se as outras pessoas vão estar usando as máscaras corretamente, ficar avaliando o risco ao qual vou me expor. Cansa voltar pra casa e viver dias de medo, o coração apertado a cada sinal de cansaço, a cada coceira na garganta.
Cansa tomar todo esse cuidado e ver que muita gente não acredita no que está acontecendo, não se cuida, briga pra não tomar os cuidados necessário. Cansa ver as notícias de gente conhecida morrendo, de todas as idades, em todas condições de saúde, enquanto tanta gente prega as conspirações mais escalafobéticas e sem sentido, exalando esse ar de superioridade por saber de tudo aquilo que eu não sei. Cansa essa indignação que pressiona o peito vendo os bares cheios de gente gritando e pulando uns sobre os outros pra tirar fotinhas postar no insta, como prova inequívoca da sua absoluta felicidade, que, na verdade, está só na casa. Cansa o sofrimento a cada parente ou amigo que aparece doente, à distância a gente nunca saber se deve ou não ficar pedindo notícias. Essa indignação por dar tanto valor à minha vida e a dos próximos de mim, enquanto que outros pouco se importam se vivem ou morrem, e fazem questão de bradar isso o tempo todo.
Cansa não ver os amigos. Cansa usar essas chamadas de vídeo e teleencontros pra tentar compensar o distanciamento. Cansa não viajar, não ir pro mato, pra praia, pras outras cidades onde vive gente que a gente gosta. Cansa essa tristeza que não acaba…

O direito de consertar

Essa mania nossa de jogar coisas fora ao menor defeito está levando o mundo para um buraco sem fundo, ou melhor, para o topo de uma montanha sem tamanho: uma montanha de lixo.

O que hoje nos parece normal, jogar fora um aparelho qualquer porque o conserto é impossível ou mesmo inviável (pelo custo, por não encontrarmos peças e outros motivos), não pode continuar assim. A bateria da sua geringonça eletrônica pára de recarregar e lá se vai o aparelho todo para o lixo.

Não era assim antes. Para trocar, por exemplo, a bateria do celular, era só tirar a tampa traseira e trocar. Sem NENHUM esforço ou conhecimento técnico especializado ou habilidade refinada. Hoje, você leva numa assistência técnica especializada e paga quase o preço de um aparelho novo, ou leva num serviço alternativo, coloca uma bateria alternativa e troce para ela durar bem e não pegar fogo.

Mas nem tudo está perdido. Outro dia, nossa panela de pressão, da T-Fal, que já deve ter uns 20 anos, ficou com a borracha de vedação da tampa ressecada. Por força do hábito já estava procurando outra panela para comprar quando me deu um estalo, Procurei a achei a borracha. Na verdade achei várias, desde a original da marca até uma dezena de alternativas. Comprei e a panela está como nova. Usamos aqui em casa umas panelas de cerâmica da Ceraflame. Duas delas estavam com o cabo quebrado. Seguindo meu mesmo estalo, entrei em contaco com o fabricante e me indicaram a loja que vende os cabos (e tampas e outras peças). Dias depois, as panelas como novas.

Na França já aprovaram uma lei que exige que o mercado tenha peças de reposição acessíveis, de modo a evitar a geração de lixo. Precisamos que a idéia se espalhe.

Se você está depositando suas esperanças em uma vacina para o COVID-19, segue um choque de realidade.

Para aqueles que têm esperança de uma iminente vacina Covid-19, a notícia neste fim de semana de que a primeira poderia ser lançada “logo após o Natal” provavelmente terá levantado os ânimos.

O vice-chefe médico do Reino Unido, Prof. Jonathan Van-Tam, disse aos deputados que uma vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e AstraZeneca poderia estar pronta para ser implantada em janeiro, enquanto Sir Jeremy Farrar, membro do grupo consultivo científico Sage e diretor do Wellcome Trust, disse que pelo menos uma das vacinas do Reino Unido poderia estar pronta na primavera.

Muito tem sido dito sobre como o mundo voltará ao normal quando uma vacina estiver amplamente disponível. Mas isso não é verdade. É importante que sejamos realistas sobre o que as vacinas podem e não podem fazer.

As vacinas protegem os indivíduos contra doenças e, espera-se, também contra infecções, mas nenhuma vacina é 100% eficaz. Para saber que proporção de uma comunidade seria imune após um programa de vacinação é um jogo de números – devemos multiplicar a proporção de uma população vacinada pelo quão eficaz a vacina é.

O Reino Unido tem atualmente uma das maiores coberturas nacionais de vacina contra a gripe do mundo, vacinando cerca de 75% das pessoas com mais de 65 anos contra a gripe todos os anos; a maioria dos países ou faz pior ou não tem programas de vacinação para pessoas idosas. É razoável esperar que este nível de cobertura possa ser alcançado para uma vacina Covid-19 naquela faixa etária no Reino Unido.

Portanto, se a vacina Covid-19 for 75% eficaz – o que significa que 75% dos vacinados tornam-se imunes – então, na verdade, protegeríamos apenas 56% dessa população alvo (75% de 75%). Isto não seria suficiente para impedir a circulação do vírus. Quase metade do nosso grupo de maior risco permaneceria suscetível, e não saberemos quem são. O relaxamento das regras de distanciamento social ao enfrentar esses riscos parece um pouco como a roleta russa.

Agora vamos olhar para pessoas com menos de 65 anos em grupos de risco médico. Em um bom ano, o Reino Unido vacina 50% deles contra a gripe. Isso significa que pouco mais de um terço deles serão protegidos (50% de 75%). Só para piorar a situação, reguladores como a US Food and Drug Administration e a Agência Européia de Medicamentos disseram que aceitariam um nível 50% inferior de eficácia para as vacinas candidatas Covid-19. Se esse nível de eficácia for atingido, temos que multiplicar a cobertura por 50% de eficácia e não 75%, e de repente tudo se torna mais preocupante.

Além de proteger os indivíduos, as vacinas podem proteger as comunidades, através da interrupção da transmissão. Um dos melhores exemplos vem da campanha de vacinação contra a meningite C do Reino Unido no final dos anos 90. Houve uma redução de 67% no número de casos em crianças e jovens não vacinados porque eles estavam sendo protegidos pelas pessoas próximas que haviam sido vacinadas e não estavam mais transmitindo a infecção.

Se quisermos ver a proteção da população de uma vacina Covid-19, vamos precisar de altos níveis de proteção (cobertura x eficácia) em todas as idades – vacinando não apenas os grupos de risco, como está sendo planejado.

Para interromper a transmissão, devemos vacinar qualquer pessoa que possa transmitir a infecção. Qualquer coisa a menos significa que nosso objetivo é apenas a proteção individual e não a interrupção da transmissão. Um anúncio recente do chefe da força-tarefa de vacinação do Reino Unido, que a estratégia será a vacinação dirigida, deixa bem claro que a estratégia de vacinação do Reino Unido no momento não é tentar interromper a transmissão, apesar de ter centenas de milhões de doses de vacina Covid-19 sob contrato. Com menos de 10% da população mostrando evidência de ter sido infectada, a vacinação direcionada não permitirá o retorno da “vida como antes habitual”.

Mesmo que os países decidam mudar de uma política de proteção pessoal para uma estratégia de transmissão-interrupção, os obstáculos permanecem. Muito dependerá do sucesso da vacinação (provavelmente com duas doses) de pessoas que não se viram anteriormente em risco elevado. O desafio será persuadir os jovens, por exemplo, a serem vacinados, não para seu próprio benefício, mas para o benefício de outros.

A adesão às recomendações para qualquer intervenção Covid-19 – distanciamento social, lockdowns, trabalho doméstico, férias canceladas ou vacinações – depende da confiança. Se os políticos nos dizem que as imposições atuais sobre nossas vidas só vão durar até que tenhamos vacinas, então a realidade é que uma falsa esperança está sendo promulgada.

As vacinas são provavelmente a mais poderosa intervenção de saúde pública disponível para nós. Mas a menos que seus benefícios sejam comunicados com realismo, a confiança em todas as recomendações será posta em risco.

Embora a esperança e o otimismo sejam muito necessários nestes tempos sombrios, é importante ser transparente. Precisamos comunicar a mensagem clara de que, embora a vacinação direcionada possa oferecer alguma proteção, ela não irá simplesmente proporcionar “a vida como era antes”.

Lovecraft passou mais longe ainda.

Quando fiquei sabendo que estavam fazendo uma série chamada Lovecraft Country, baseada no livro homônimo, do qual eu nunca tinha ouvido falar, fui lá e li o livro. Só porque tinha Lovecraft no título.

De Lovecraft no Livro, muito pouco. Curtos episódios que remetem ao horror cósmico e só. A expressão “Lovecraft Country” tem um significado bem específico e único.

Logo no início, Atticus está vindo da Flórida para Chicago, por causa de uma carta que recebeu de seu pai. Ao sair do Kentucky ele se diz fora da região mais racista dos EUA. Entretanto, mais adiante, vai se encontrar com o Tio George, que, sabendo que ele quer procurar o pai em uma cidade de Massachussets, alerta que ali é o território Lovecraft (Lovecraft Country) e mostra um poema do autor “Sobre a criação dos negros”, notada e nojentamente racista. A expressão “Lovecraft Country” é isso: uma região que se acredita não ser racista, mas que tem muita gente que pensa como seu conterrêneo, H. P. Lovecraft. O tema central do livro é o racismo, não o horror cósmico Lovecraftiano. É um horror de outro tipo, infelizmente, muito mais concreto e palpável. No fim das contas, o livro é legal, mas não memorável.

Daí, vem a série. A cena de abertura é primorosa: em um sonho consegue caracterizar Atticus e demonstrar sua ligação profunda com a literatura “pulp’. Entratanto, logo no primeiro episódio, já vi que abriram mão de algumas coisas que eu considero relativamente relevantes e colocaram no lugar montes de gritos e correria.

Vou seguindo. Personagens modificados, alguns tão diferentes que precisam arrumar gambiarras para que a trama siga. Matam um personagem que tem papel fundamental durante toda a estória. Chirstina não existe no livro.

Um momento profundamente Lovecraftiano, quando os protagonistas precisam entrar em uma sala que não obedece as leis da física ou da geometria, toda fora de proporção sem permitir adotar uma referência e onde a gravidade parece ter vontade própria, patrulhada por uma entidade explicitamente não natural, virou um arremedo de “Uma Noite no Museu” cruzado com “A Lenda do Tesouro Perdido”. Muita correria e gritaria, nenhum horror cósmico.

Segue a série. Tudo diferente na casa da Letitia: o romance dela com atticus, o contato com a entidade que vive na casa, os invasores e seu destino, enfim, tudo cada vez mais distante do que acontece no Livro. A transformção da Ruby perde muito com as escolhas aplicadas (Ruby / Ruiva?).

Um episódio inteiro que não tem absolutamente nenhuma ligação com o livro, mostrando o que aconteceu com Atticus na Coréia: além de, até agora, não ter se ligado à trama, reduz muito o impacto que os eventos sobrenaturais que no presente Atticus tem que enfrentar, uma vez que ele já enfrentou o sobrenatural no passado. E que coincidência do caramba o cara se envolver de novo, do outro lado do mundo, com coisas do outro mundo.

Aí vem Hipolyta. O capítulo do qual ela é protogaonista é, talvez, o momento lovecraftiano mais forte do livro. Transportada para outro planeta, descobre pessoas que ali foram aprisionadas e enfrentam um dia a dia que desafia a sanidade e a vida. No livro. Na série, Hipolyta também é transportada, mas para um mundo que parece saído da mente de um Coach ou das páginas de um livro de auto ajuda. Ali, por várias afirmações ela se transforma e se descobre. Bom para quem gosta. Nada a ver com a estória. Nada a ver com Lovecraft. Atticus aparecer do nada, vindo de St.Louis, a 770km de distância, não ajuda.

Fico meio assim de escrever sobre uma série antes do fim. Sei lá o que pode acontecer. podem consertar tudo quando acabar. Mas achei, até agora, tudo muito sem rumo. Li uma entrevista da criadora da série, Misha Green, em que ela dizia que o livro era só o ponto de partida para algo mais profundo (uma pitadinha de arrogância?). O que vi até agora parece mais um balaio de gatos.

Sério que acreditam nisso?

Obra dos todo-poderosos algoritmos, não tenho na minha bolha nenhum descrente da pandemia. Todas as pessoas com quem convivo e me relaciono pelas redes sociais acreditam e dão importância à calamidade que estamos enfrentando.

Eis que começo a seguir o perfil de um jornal aqui da cidade e começo a ver os comentários nas notícias sobre a pandemia. Custo a acreditar no que leio. Difícil mesmo.

Já vinha horrorizado com os perfis de checagem de notícias, que desmentem constantemente as coisas mais escalafobéticas e me questiono o tempo todo: “quem acredita nisso?”

Nos comentários registrados no perfil noticioso, eles se materializaram. Começo a responder aos comentários, a comentar também e me deparo com uma mentalidade impermeável à realidade. Não consigo imaginar se simplesmente se alienaram do mundo que os cerca, se não dão crédito às notícias que chegam do mundo todo, às quais temos acesso fácil e imeditaoo pela tal da Internet, se acreditam em uma grande conspiração mundial destinada a criar o clima terror na população.

Jamais estaria nesse grupo. Leio toneladas de notícias todos os dias, poucas animadoras. Perdi pelo menos uma amiga para a doença, além de alguns colegas de trabalho não próximos; familiares meus passaram pelo aperto de ter a doença recentemente. Conheço pessoas que se curaram e não voltaram ao normal, vão carregar seqüelas. Tenho muitos amigos a parentes médicos, que estão passando algo que nunca viram antes, e sempre me contam como é.

Quem tem esse tipo de gente, que embarcou nesse sentimento desinformado, em seu círculo de relacionamentos precisa agir. É preciso que conversemos com essas pessoas, que os instemos a ouvir médicos e profissionais de saúde que têm na família e entre os amigos. Os que se negam a creditar são um risco para todos nós.

 

Se não mudar, o capitalismo vai matar a humanidade de fome até 2050.

Artigo de Drew Hansen

Originalmente publicado na Forbes

O capitalismo tem gerado uma enorme riqueza para alguns, mas tem devastado o planeta e falhado em melhorar o bem-estar humano em escala.

– As espécies estão se extinguindo a um ritmo 1.000 vezes superior à da taxa natural nos 65 milhões de anos anteriores (ver Centro de Saúde e Ambiente Global da Faculdade de Medicina de Harvard).

– Desde 2000, 6 milhões de hectares de floresta primária foram perdidos a cada ano. São 14.826.322 hectares, ou um pouco menos que todo o estado da Virgínia Ocidental (ver a avaliação de 2010 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura).

– Mesmo nos Estados Unidos, 15% da população vive abaixo da linha de pobreza. Para crianças menores de 18 anos, esse número aumenta para 20% (ver o Censo dos EUA).

– Espera-se que a população mundial atinja 10 bilhões até 2050 (ver as projeções das Nações Unidas).

Como esperamos alimentar tanta gente enquanto esgotamos os recursos que nos restam?

As atividades humanas estão por trás da crise de extinção. A agricultura comercial, a extração de madeira e o desenvolvimento de infraestrutura estão causando a destruição do habitat e nossa dependência dos combustíveis fósseis é um dos principais fatores que contribuem para as mudanças climáticas.

As corporações estão respondendo à demanda e à pressão dos consumidores de Wall Street. Os professores Christopher Wright e Daniel Nyberg publicaram a Mudança Climática, Capitalismo e Corporações no outono passado, argumentando que as empresas estão fechadas em um ciclo de exploração dos recursos do mundo de formas cada vez mais criativas.

“Nosso livro mostra como as grandes corporações são capazes de continuar se engajando em comportamentos cada vez mais destrutivos do meio ambiente, obscurecendo a ligação entre o crescimento econômico sem fim e o agravamento da destruição ambiental”, escreveram eles.

O sociólogo de Yale Justin Farrell estudou 20 anos de financiamento corporativo e descobriu que “as empresas têm usado sua riqueza para ampliar visões contrárias [das mudanças climáticas] e criar uma impressão de maior incerteza científica do que realmente existe”.

O capitalismo corporativo está comprometido com a busca incessante do crescimento, mesmo que ele devore o planeta e ameace a saúde humana.

Precisamos construir um novo sistema: um que equilibre o crescimento econômico com a sustentabilidade e o desenvolvimento humano.

Uma nova geração de empresas está mostrando o caminho a seguir. Estão infundindo o capitalismo com novas idéias, especificamente no que diz respeito à propriedade dos funcionários e à gestão ágil.

A crescente importância da propriedade distribuída e da governança

Os gestores de fundos em instituições financeiras globais compõem a maioria (70%) da bolsa de valores. Estes proprietários ausentes não têm qualquer participação nas comunidades em que as empresas operam. Além disso, o capital controlado pela gestão está concentrado nas mãos de alguns poucos: o CEO e outros altos executivos.

Por outro lado, as startups têm estado dispostas a garantir equidade aos empregados. Às vezes essa distribuição de capital é feita para compensar salários menos competitivos, mas mais frequentemente é oferecida como um incentivo financeiro para motivar os funcionários a construir uma empresa de sucesso.

De acordo com The Economist, as startups de hoje estão dispostas a incentivar através da propriedade compartilhada:

A diferença central está na propriedade: enquanto ninguém tem a certeza de quem é dono de empresas públicas, as start-ups vão muito longe para definir quem é dono de quê. No início da vida de uma empresa, os fundadores e os primeiros membros possuem uma participação majoritária – e incentivam as pessoas com participações acionárias ou recompensas relacionadas ao desempenho. Isso sempre foi verdade para as startups, mas hoje os direitos e responsabilidades são meticulosamente definidos em contratos elaborados por advogados. Isso alinha interesses e cria uma cultura de trabalho duro e camaradagem. Por serem privados e não públicos, eles medem como estão fazendo usando indicadores de desempenho (como quantos produtos eles produziram) em vez de elaborar normas contábeis.

Esta tendência é ouvida nas cooperativas, onde os empregados são coletivamente donos da empresa e participavam das decisões de gestão através de seus direitos de voto. Mondragon é o exemplo frequentemente citado de uma cooperativa de trabalhadores moderna e bem sucedida. A ampla base de propriedade dos empregados de Mondragon não é o mesmo que um Plano de Propriedade de Ações dos Empregados. Com a propriedade vem uma diferença – controle – sobre o negócio. Seus trabalhadores elegem a gerência, e a gerência é responsável perante os empregados.

A REI é uma cooperativa de consumo que chamou a atenção no ano passado, quando optou por não participar das vendas da Black Friday, incentivando seus funcionários e clientes a passar o dia ao ar livre em vez de fazer compras.

Suspeito que as empresas mais bem sucedidas sob esta forma emergente de capitalismo terão estruturas de propriedade menos concentradas e mais igualitárias. Elas se beneficiarão não apenas financeiramente, mas também comunitariamente.

A propriedade conjunta levará a uma gestão colaborativa

A organização hierárquica das corporações modernas dará lugar a redes ou comunidades que fazem com que a colaboração seja primordial. Muitas opções para estruturas de gestão mais fluidas e ágeis podem tomar conta.

Por exemplo, empresas mais novas estão experimentando modelos alternativos de gestão que buscam capacitar os funcionários mais do que uma hierarquia tradicional normalmente faz. Dessas novas abordagens, a holacracia é a mais amplamente conhecida. Ela promete trazer estrutura e disciplina a um local de trabalho entre pares.

A holacracia “é uma nova forma de gerir uma organização que remove o poder de uma hierarquia de gestão e o distribui através de funções claras, que podem então ser executadas de forma autónoma, sem um chefe micro-gerente”.

Empresas como Zappos e Medium estão em diferentes fases de implementação do sistema de gestão.

A Valve Software em Seattle vai ainda mais longe, permitindo que os colaboradores selecionem os projetos em que querem trabalhar. Os funcionários então mudam suas mesas para a área de escritório mais propícia para colaborar com a equipe do projeto.

Estes são pequenos passos para um sistema que valoriza mais o funcionário do que o que ele pode produzir. Ao dar aos funcionários uma maior participação na tomada de decisões, as corporações farão escolhas que garantam o futuro do planeta e dos seus habitantes.

 

Por que o feedback nunca vale a pena

Oliver Burkeman (publicado originalmente no Guardian)

Em seu próximo livro, “Nove mentiras sobre o trabalho”, Marcus Buckingham e Ashley Goodall fazem uma afirmação surpreendente, com implicações muito além do local de trabalho: eles argumentam que dar feedback às pessoas – no sentido de dizer-lhes o que você acha que estão fazendo certo ou errado, e como fazer melhor – nunca vale a pena. Isso vai contra uma tendência corporativa atual de “sinceridade radical”, por exemplo na Netflix, onde, de acordo com relatórios recentes, as falhas dos funcionários são implacavelmente “exibidas” na frente dos outros. (Quando alguém é demitido, centenas de ex-colaboradores podem receber um e-mail post mortem, enumerando suas falhas.) Mas também contradiz uma suposição que a maioria de nós traz para nossas vidas como pais, cônjuges, gerentes e amigos – que é útil, pelo menos às vezes, e desde que você o faça bem, explicar às pessoas onde eles estão cometendo erros.

Buckingham e Goodall não afirmam apenas que você deve guardar esse conhecimento para si mesmo: eles afirmam que você não o possui e que, na verdade, você provavelmente não sabe como um empregado fraco (ou marido irritante, ou o que quer que seja) poderia mudar mais efetivamente. É um velho clichê dos conselhos conjugais que você deve usar “I-statements” em vez de “you-statements”, dizendo à outra pessoa como seu comportamento faz você se sentir, em vez de atacá-la por ser egoísta e incompetente. O raciocínio padrão é que as suas declarações fazem com que as pessoas respondam defensivamente. Mas outra é que você é um péssimo pra julgar se alguém é egoísta ou incompetente. Como Buckingham escreve: “O único domínio em que os humanos são uma fonte irrepreensível de verdade é o de seus próprios sentimentos e experiências.

Muitas pesquisas mostram que somos particularmente maus em classificar as pessoas em função de critérios abstratos, o que significa que uma característica comum das avaliações de desempenho no local de trabalho – avaliar se um funcionário é, digamos, um pensador estratégico ou um jogador de equipe – é essencialmente inútil. (Na verdade, dada a moda das avaliações de desempenho de “360 graus”, em que todos avaliam todos, é pior do que inútil: agora você está olhando através de múltiplas lentes distorcidas, ao invés de uma.) Devemos substituir esse tipo de julgamento, argumentam os autores, por “reações”. Não diga aos outros o que você pensa de suas habilidades, ou o quão boas você pensa que elas são; em vez disso, concentre-se em descrever sua experiência de trabalho. Você não é bom em julgar como outra pessoa deve mudar sua abordagem para (digamos) fazer apresentações. Mas você é a autoridade sobre se uma determinada apresentação foi persuasiva ou chata para você.

E as reações positivas, mostram, funcionam melhor do que as negativas: somos excelentes “quando as pessoas que nos conhecem e se preocupam connosco nos dizem o que experimentam e o que sentem, e em particular quando vêem algo dentro de nós que realmente funciona”. Há um ponto profundo aqui – que o melhor tipo de elogio se concentra em como alguém fez você se sentir, não em avaliar seu talento. Afinal, há algo estranhamente arrogante em elogiar outra pessoa por ser um bom escritor, estrategista, jogador de equipe, e assim por diante: quem fez de você o juiz de tais coisas? Mas elogiá-los por inspirá-lo, persuadi-lo, ou ajudá-lo a compreender um assunto complexo, é uma questão totalmente diferente. Você realmente é o único juiz objetivo disso.